Educação sexual e orientação sexual na escola: possibilidades

Educação sexual e orientação sexual na escola: possibilidades

Educação sexual e orientação sexual na escola

 

Deusdit Lima

 

RESUMO

 

A sexualidade é inerente ao ser humano desde a infância. Sexualidade não é o ato sexual propriamente dito, pois não apenas envolve os genitais, mas todo o corpo. Ela compreende atos de tocar, sentir, afetos, prazer, desejo pelo outro, emoção, amor, fantasias sexuais e erotismo. A sexualidade é a busca de prazer pelo contato, toque ou atração por outras pessoas. É algo que vai além do aspecto biológico e deve ser entendida como uma função humana saudável, que é influenciada pelos aspectos biopsicossocial e cultural. O presente trabalho de revisão de literatura teve como objetivo pesquisar sobre sexualidade, educação sexual e orientação sexual na escola. Essa orientação independe da disciplina, pois sexualidade, educação sexual e orientação sexual devem ser temas ligados a qualquer disciplina porque são assuntos interdisciplinares e do cotidiano. Orientação sexual é tema transversal nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs).

 

Palavras-chave:  Sexualidade. Educação sexual. Orientação sexual.

 

ABSTRACT

 

Sexuality is inherent to the human being from childhood. Sexuality is not the sexual act itself, it not only involves the genitals, but the whole body. It includes acts of touching, feeling, emotions, pleasure, desire for the other, emotion, love, sexual fantasies and eroticism. Sexuality is the pursuit of pleasure by contact, touch or attraction to other people. It is something that goes beyond the biological aspect and should be understood as a healthy human function, which is influenced by biopsychosocial and cultural aspects. This literature review study aimed to research on sexuality, sex education and sexual orientation at school. This orientation is independent of discipline, because sexuality, sex education and sexual orientation should be issues related to any discipline because they are interdisciplinary and everyday affairs. Sexual orientation is a crosscutting theme in the National Curriculum Parameters (PCNs).

Keywords: Sexuality. Sex education. Sexual orientation.

 

 

 

1 INTRODUÇÃO

 

Este trabalho de revisão de literatura teve o objetivo de pesquisar acerca de sexualidade, educação sexual e orientação sexual na escola, pois é um assunto do cotidiano.   

Por isso, é necessário que se reconheça que a “sexualidade na educação é vinculada à vida, à saúde, ao prazer e ao bem-estar, associando-se às diferentes dimensões do ser humano envolvidas nesse aspecto. Portanto, o trabalho da orientação sexual dentro das instituições [educacionais] é da promoção da saúde das crianças”, Brasil (2000, p. 128).

Logo, entende-se que a escola é uma instituição educacional que pode promover a saúde, o prazer e o bem-estar de seus alunos e nesse contexto, a orientação sexual é assunto que faz parte da saúde sexual humana, pode ser abordado como tema multidisciplinar.

Os professores deparam-se com o assunto sexualidade em sala de aula e podem orientar seus alunos, independente da disciplina; pois, sexualidade, educação sexual e orientação sexual devem ser temas ligados a qualquer disciplina e com isso poderá haver um melhor esclarecimento às dúvidas, porventura, surgidas por seus alunos.

 

2 SEXUALIDADE: CONCEITOS E HISTÓRIA

               

A sexualidade faz parte do desenvolvimento normal do ser humano e está presente em cada indivíduo desde o nascimento até a morte. A história de vida de cada um, a cultura e os valores podem exercer influência nos sentimentos individuais e consequentemente pode afetar a sua sexualidade. A Sexualidade está em cada ser humano desde a infância.

Sexualidade não é o ato sexual propriamente dito, pois envolve não apenas os genitais, mas o corpo todo. Compreende atos de tocar, sentir, os afetos, o prazer, desejo pelo outro, emoção, amor, fantasias sexuais, erotismo, etc.

Na visão de Suplicy (1993, p. 22): [...] “a sexualidade é construída, basicamente, a partir das primeiras experiências afetivas do bebê com os pais ou com quem cuida dele. Seguem-se as relações com a família, amigos e as influências do meio cultural”. Contudo, antes do nascimento da criança, os pais já ficam na expectativa para saber o sexo da criança, se masculino ou feminino, com quem vai se parecer etc., e quando a criança nasce, a sexualidade será expressa através dos afetos e dos prazeres com os cuidadores. Como exemplo, o bebê e sua mãe; ele expressa sua sexualidade através do prazer na amamentação, do sugar, do afeto, do sentir o corpo da mãe. E então, a criança vai crescendo e adquirindo vivências afetivas nas relações com a família, com o meio e com a sociedade.        

A gestação é um momento de expectativas à espera da criança e também cultural. Quando a criança nasce e é do sexo masculino é dada ao homem uma condição de superioridade, alguns pais ficam felizes porque “é macho”, homem, e isso vem da sociedade patriarcal, ainda persiste essa cultura em algumas famílias, pois isso vem desde a antiguidade. Em famílias tradicionais, muito conservadoras, cujos pais exercem uma criação rígida e com pouca ou nenhuma afetividade, a sexualidade desse indivíduo poderá sofrer influência no futuro em seus processos amorosos, isto é, ao crescer, o indivíduo poderá ser induzido à agressividade, à falta de afeto, conflitos pessoais e até a competitividade.

Para Aristóteles (1998, p. 33) no que diz respeito à “sexualidade dos indivíduos a diferença é indelével, pois, independente da idade da mulher, o homem sempre deverá conservar a sua superioridade”. Entende-se com isso que ele colocou o homem num patamar acima da mulher numa espécie de hierarquia, de ser superior, capaz e responsável pela família e a mulher incapaz de exercer qualquer outra função, apenas podia obedecer ao seu marido como se ela fosse uma escrava cuja função era de obedecer ao seu senhor e também por ter natureza fraca. Essa era a visão de sexualidade à época, mas com o passar dos anos, essa percepção foi se tornando mais abrangente em relação ao corpo.     

Então, a sexualidade não se limita aos órgãos sexuais e ao ato sexual. Inicia-se desde o nascimento, abrangendo o corpo inteiro e não se limita ao pênis e a vagina.  Envolve fantasias, afetos, formas de sentir e tocar. Cada indivíduo expressa sua sexualidade de modo diferente e subjetivo em cada etapa da vida. Portanto, a sexualidade é compreendida como algo inerente ao ser humano, que se manifesta desde o nascimento até a morte, sendo construída ao longo da vida e influenciada pela história, cultura, valores, afetos e sentimentos. A idade cronológica não significa fator preponderante para deixar de exercer sua sexualidade.

 

3 SEXUALIDADE E SEXO: DIFERENÇA

 

Freud (1974) instituiu o termo sexualidade num contexto diferente de sexo e se referiu à sexualidade como pulsão, libido, uma energia própria do ser humano que inicia desde o seu nascimento. Essa energia gera gratificação, prazer  e está vinculada a zonas erógenas distintas ao longo do desenvolvimento que compreende as fases oral, anal, fálica e a fase genital que são diferentes formas pelas quais a pulsão sexual, isto é, o instinto, uma espécie de energia (sexual) e se manifesta e vai até a vida adulta.

A sexualidade não deve ser confundida com genitalidade, pois esta diz respeito aos órgãos genitais e sexualidade é mais abrangente, compreende o corpo todo, é um prazer em qualquer parte do corpo. A função sexual existe desde o princípio de vida, após o nascimento e não só a partir da puberdade e não se limita à função dos órgãos genitais.

Uma série de excitações e de atividades, presentes desde a infância, proporcionam um prazer e gera reações fisiológicas em todo o corpo gerando satisfação erótica. Sexo diz respeito ao ato sexual propriamente dito, isto é, através da penetração do órgão sexual masculino. A sexualidade depende de aspectos históricos e culturais e antigamente era associada ao poder.

Foucault (1988) mostra que a sexualidade sofre influências sociais, culturais e históricas. É a sociedade e a cultura que determinam se algumas práticas sexuais são apropriadas ou não, morais ou imorais, saudáveis ou não permitidas ou até doentias. A sexualidade instituiu-se como um dispositivo de saber, prazer e poder porque abrange as relações entre homens e mulheres, entre jovens e adultos, entre educadores e alunos e também na sociedade e política para debates sobre o que é possível e o que é ético praticar, isto é, o poder que regula e que normatiza a prática da sexualidade.

Portanto, a sexualidade provoca uma relação de poder sobre ela porque produz normas, controle e censura daquilo em que em determinada época se considerava incorreto, irregular, não habitual, fora de costume. O que se deve respeitar são as normas sociais e culturais de cada povo porque para muitas culturas a sexualidade ainda pode ser vista como vergonhosa e algumas práticas sexuais proibidas.  Portanto, a sexualidade é influenciada pela história e cultura de cada sociedade.

Percebe-se que a sexualidade vai muito além de ser algo prazeroso e mantido em segredo ou sigilo, pois abrange aspectos culturais, sociais e políticos, isto é, no sentido de uma discussão ou debate pela sociedade e por grupos, como exemplo, câmera dos deputados e o senado federal que discutem questões éticas, didáticas e normas de conduta para serem adotadas em escolas.  

 

4 EDUCAÇÃO SEXUAL E ORIENTAÇÃO SEXUAL

 

Existe diferença entre Educação Sexual e Orientação Sexual? Existe, sim, como diz Vitello.

 Para Vitiello (1997, p. 95) “a orientação implica num mecanismo mais elaborado, segundo o qual baseando-se na experiência e nos seus conhecimentos o orientador ajuda o orientando a analisar diferentes opções, tornando-o assim apto a descobrir novos caminhos”. Isso difere do conceito de educação sexual como vemos a seguir. 

Educação é um processo longo que abrange toda a vida e que o educador dá ao educando condições e meios para que ele possa crescer, tanto em maturidade quanto em novos conhecimentos. Educar, no sentido mais amplo, significa formar. Significa dizer que o indivíduo apreende e aprende, o que o faz crescer no conhecimento e isso contribui com a sua formação.

 Na questão da educação sexual a família deve ter grande empenho para que isso possa acontecer porque é um processo mais demorado, que abrange as fases da vida, ou seja, infância, adolescência e até adulto. A orientação sexual pode se referir apenas a alguns temas ou dúvidas surgidas momentamente e isso tanto a família quanto a escola podem contribuir com as orientações cabíveis, apesar de que professores poderão ter dificuldades nessa orientação.       

Sobre as dificuldades dos professores em orientar seus alunos, Maia et al. (2006, p. 107) diz o seguinte: 

Muitos educadores possuem dificuldades em orientar seus alunos que podem ser: por razões pessoais, falta de informações específica voltadas na área da sexualidade e até mesmo por falta de orientação e de recursos metodológicos que ajude o professor a compreender a realizar uma orientação sexual adequada. Porém, a formação destes profissionais ao se trabalhar com a temática é de grande importância para que se possa evitar a passagem de conceitos pessoais, preconceitos ou ideias inadequadas.

 

Quando se fala de sexualidade, o professor pode ser um agente transformador do conhecimento, isto é, que ele possa levar esse conhecimento e poder influenciar na mudança da estrutura social e por isso, é essencial que ele seja imparcial, desprovido de preconceitos em relação à sexualidade. Por isso, o professor necessita de formação na área de sexualidade para poder estar apto a orientar seus alunos, ensinar a respeitar as individualidades, as diversidades e as condições sexuais de cada um e levar o conhecimento e promover a educação sexual e ou orientação sexual no ambiente escolar. Para alguns professores, falar de sexualidade em sala de aula poderá ser um assunto difícil pela falta de conhecimento ou por razões pessoais.

Sobre educação sexual, Nunes (1997, p. 20) afirma que os educadores são despreparados para assuntos e situações que envolvem a sexualidade, tornando assim um assunto silenciado e vergonhoso.

Muitos educadores, freqüentemente aquelas professoras que trabalham nos primeiros anos do 1° grau, afirmam que têm muitos “problemas” com relação à sexualidade. Queixam-se de palavrões, jogos e desenhos, manifestações que, segundo elas, “antigamente não eram assim, havia maior respeito...” Confusas, atribuem essa “permissividade” com plenas certezas à desagregação moral de nosso tempo, lançando abstratamente uma culpa ideal sem sujeito sobre toda a sociedade. Não compreende que o apelo à sexualidade está muito mais forte hoje, produzido pelo sistema econômico e dosado a todos os níveis sociais. Não percebem que essa descompressão da sexualidade está condicionada pela fase que entre nós passa a estrutura econômica da sociedade. Portanto, não é um nível meramente moral que esta deve ser tratada, mas num nível socioanalítico estrutural. Para essas educadoras a expressão da sexualidade infantil é entendida como ato de “indisciplina e sem-vergonhice”. É claro que não podemos generalizar essas opiniões e compreensão das coisas. Falamos metodologicamente dos círculos mais tradicionais e mais comprometidos com a ideologia conservadora hegemônica.

 

É perfeitamente compreensível que algumas professoras tenham essa dificuldade de falar sobre sexualidade. Isso pode ser por questões associadas a valores éticos, morais, atitudes, comportamentos, vergonha e desconhecimento ou despreparo para encarar o assunto. Algumas professoras chamam os “palavrões”, jogos e outros, de “permissividade” e “sem-vergonhice” e com isso elas ficam confusas e com dificuldades em lidar com o assunto. Por isso, muitas escolas ainda não adotam os temas transversais definidos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs).

Atualmente, as normas curriculares definidas como temas transversais pelos PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais estão à disposição das escolas. Como ainda não é obrigatória, a decisão de adotar cabe a cada escolar.

 

 

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A adolescência é uma fase de mudança corporal, e nesse período os adolescentes têm dúvidas sobre sua sexualidade porque vão iniciar e experimentar os prazeres oriundos da sexualidade.

A sexualidade é a busca de prazer, a descoberta das sensações proporcionadas pelo contato ou toque, atração por outras pessoas, é algo que vai além do biológico. Essas sensações de prazer estão presentes desde a infância até a velhice.    

Na escola, a orientação sexual deve ser atribuída a professores  capacitados e preparados para essa função, a fim de esclarecer eventuais dúvidas que os alunos possam apresentar.

Estudos dessa natureza tornam-se relevantes porque além de trazer para o meio acadêmico informações valorosas a respeito do tema em referência, poderá incentivar outras pessoas a fazerem estudos na área em busca de novas informações e conhecimentos e poderão ajudar aos professores na educação sexual e orientação sexual de seus alunos em sala de aula.

 

REFERÊNCIAS

 

ARISTÓTELES. A Política. [tradução de Roberto Leal Ferreira]. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 33.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: pluralidade cultural, orientação sexual. 2.ed. Brasília, 2000. v. 10, p. 112-128.

FOUCAULT, Michel. História da sexualidade I: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Graal, 1988.

FREUD, Sigmund.  Obras Completas. Rio de Janeiro: Imago, 1974.

MAIA, A. C. B. et al. Orientação sexual para professores: formulário para avaliar a aquisição de conhecimento sobre sexualidade infantil. Mimesis, Bauru, v. 27, n. 2, p. 107- 123, 2006.

NUNES, C. A. Desvendando a Sexualidade. 2. ed. Campinas: Papirus, 1997, p. 20.

SUPLICY, M. Educação e Orientação Sexual. In: RIBEIRO, M. (org.). Educação sexual: novas idéias, novas conquistas. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1993, p. 22.

VITIELLO, N. Sexualidade: Quem educa o educador. São Paulo: Iglu, 1997, p. 95.